Os Mediadores Imobiliários e os advogados, a par de outros agentes de mercado, trabalham de mão dada e chegam até a ser parceiros de negócios. Mas acontece também que, por vezes, se criam zonas cinzentas e se misturam as suas áreas de influência, entrando uns nos trabalhos dos outros. É, aliás, um tema que já chegou aos tribunais. Para tentar evitar mais casos destes, neste artigo vamos explicar quais as competências exclusivas dos Agentes Imobiliários e dos advogados, com a ajuda de especialistas.

No passado mês de junho, o Supremo Tribunal de Espanha proferiu um acórdão no qual distinguiu a atividade de Mediação Imobiliária e a assessoria jurídica oferecida pela Agência Imobiliária aos seus clientes, declarando expressamente que localizar potenciais compradores de um imóvel é uma atividade incompatível com a prestação de assessoria jurídica e/ou fiscal muitas vezes prestada pelos mediadores sob a forma de “conselhos”.

Já em Portugal, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa decretou o encerramento de uma Agência de Mediação Imobiliária do concelho de Mafra por atos de procuradoria ilícita, tendo existido mais de 200 participações e instaurando-se mais de 120 processos-crime no ano de 2020 no âmbito da atividade de procuradoria ilícita.

 

A competência exclusiva das Agências Imobiliárias

Em Portugal, a atividade de Mediação Imobiliária apenas pode ser exercida por empresas de Mediação Imobiliária e mediante contrato. Relembramos que a atividade de Mediação Imobiliária se consubstancia no desenvolvimento das seguintes ações:

  • Prospeção e recolha de informações que visem encontrar os bens imóveis pretendidos pelos clientes (sendo considerados como clientes a pessoa ou entidade que celebra com uma empresa habilitada nos termos da lei um contrato visando a prestação de serviços de Mediação Imobiliária);
  • Promoção dos bens imóveis sobre os quais os clientes pretendam realizar negócios jurídicos, designadamente através da sua divulgação ou publicitação, ou da realização de leilões.

Assim, a atividade de Mediação Imobiliária apenas poderá ser exercida por mediadoras que deverão previamente instruir, junto dos serviços do IMPIC, um pedido de licenciamento, devendo para tal:

  • Possuir idoneidade comercial;
  • Serem detentoras de um seguro de responsabilidade civil, garantia financeira ou instrumento equivalente que o substitua.

 

A competência exclusiva dos advogados

A lei determina que apenas os licenciados em Direito com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados e os solicitadores inscritos na Ordem dos Solicitadores podem praticar os atos próprios dos advogados e dos solicitadores.

Consideram-se atos próprios dos advogados e dos solicitadores os que forem exercidos no interesse de terceiros e no âmbito de atividade profissional, sem prejuízo das competências próprias atribuídas às demais profissões ou atividades cujo acesso ou exercício é regulado por lei.

Alguns exemplos de atos próprios dos advogados e dos solicitadores são:

  • Consulta jurídica – a atividade de aconselhamento jurídico que consiste na interpretação e aplicação de normas jurídicas mediante solicitação de terceiro;
  • Prática dos atos preparatórios – tendentes à constituição, alteração ou extinção de negócios jurídicos, designadamente os praticados junto de conservatórias e cartórios notariais;
  • Elaboração de contratos – a elaboração de contratos ou o simples preenchimento de minutas de contratos com vista à formalização de negócios jurídicos;
  • O exercício do mandato forense – ato unilateral, pelo qual alguém (o mandante) confere a outrem (o mandatário) poderes de representação. Considera-se mandato forense o exercício do mandato com representação, com poderes para negociar a constituição, alteração ou extinção de relações jurídicas e o exercício de qualquer mandato com representação em procedimentos administrativos, incluindo tributários, perante quaisquer pessoas coletivas públicas ou respetivos órgãos ou serviços, ainda que se suscitem ou discutam apenas questões de facto;
  • Negociação tendente à cobrança de créditos.

O advogado exercita a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável. Assim, o exercício da advocacia é inconciliável com qualquer cargo, função ou atividade que possa afetar a isenção e independência, o que explica a incompatibilidade do exercício da advocacia com as funções e atividades de mediador mobiliário ou imobiliário.

 

Dois exemplos a ter em conta

  • O preenchimento de minutas de contratos-promessa de compra e venda

É habitual a utilização de minutas por partes de Agências Imobiliárias que se limitam a preencher os espaços em branco com os dados dos contraentes e a realizar pequenos ajustes de acordo com as pretensões das partes.

Neste caso, sempre que uma Imobiliária usa uma minuta de contrato e a altera, está a praticar atos próprios dos advogados que se encontram regulados por Lei, nomeadamente consulta jurídica e elaboração de contratos. Naturalmente que as partes de um contrato-promessa de compra e venda de um imóvel poderão elaborar ou preencher uma minuta, desde que o façam a título particular, assumindo dessa forma os riscos e as potenciais consequências que possam advir do mesmo.

  • Procuração em nome da Agência Imobiliária

Outra questão que por vezes se suscita é a possibilidade de uma Agência de Mediação Imobiliária ou agente ser mandatado para negociar um bem imóvel, por forma a que, em representação do seu cliente, possa celebrar contratos e praticar os atos necessários à preparação do negócio jurídico junto de entidades públicas.

Mais uma vez, embora o particular tenha o direito a constituir procurador e mandatar um familiar, amigo ou advogado para o efeito, tal não justifica que uma Imobiliária possa praticar atos exclusivos a advogados e solicitadores de forma habitual e regular.

 

As consequências da prática de atos próprios de advogado sem habilitação

A lei determina que quem (i) praticar atos próprios dos advogados e dos solicitadores ou (ii) auxiliar ou colaborar na prática de atos próprios dos advogados e dos solicitadores, sem estar legalmente habilitado a tal, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias. Além do lesado, a Ordem dos Advogados e a Ordem dos Solicitadores poderão apresentar queixa, desencadeando o respetivo procedimento criminal.

Por fim, constitui uma contraordenação a promoção, divulgação ou publicidade de atos próprios dos advogados ou dos solicitadores, quando efetuada por pessoas, singulares ou coletivas, não autorizadas a praticar os mesmos, estando sujeita a uma coima que varia entre 500 e 2.500 euros, no caso das pessoas singulares, e entre 1.250 e 5.000 euros, no caso das pessoas coletivas, sendo estes limites aumentados até 12.500 e 25.000 euros, respetivamente, em caso de reincidência.

 

Fonte: Idealista


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