A histórica loja Ginjinha Sem Rival, instalada na zona histórica de Lisboa desde 1890, tem ordens para fechar portas no final do mês de junho, mas o gerente promete “lutar até ao fim”, nem que seja nos tribunais.
Em causa está um diferendo entre o gerente da Ginjinha Sem Rival, Nuno Gonçalves, e o atual proprietário do edifício, Axel Gassmann, um empresário alemão que instalou no mesmo prédio um hotel e que denunciou o contrato de arrendamento da loja centenária, situada na Rua das Portas de Santo Antão, a poucos metros da Praça do Rossio.
A mediar este conflito está a Câmara Municipal de Lisboa, através do vereador responsável pelo programa “Lojas com História”, Diogo Moura, que admitiu que o desfecho mais previsível é este diferendo acabar a ser esgrimido nos tribunais.
Alheios a este problema, centenas de turistas continuam a entrar diariamente na Ginjinha Sem Rival para provar o tradicional licor de ginja, deixando Abílio Coelho, há mais de 50 anos atrás do balcão deste estabelecimento, sem mãos a medir.
Com um rosto mais fechado, o gerente deste espaço centenário, Nuno Gonçalves, bisneto do fundador, lamentou a intransigência do atual senhorio em anuir à permanência deste negócio com a mesma gerência.
“A posição do senhorio é totalmente irreversível. Há mais de um mês que não mostra qualquer vontade, nem de dialogar connosco, nem com a Câmara Municipal de Lisboa, porque acha que tem o direito de ficar com a loja. Nós não concordamos e, portanto, serão os tribunais a decidir”, afirmou.
Nuno Gonçalves referiu ainda que recebeu uma proposta “irrisória” de Axel Gassmann para a aquisição da Ginjinha, classificando-a como “inaceitável”.
“A minha família até a considerou, além de inaceitável, ofensiva, porque o senhor ofereceu 250 mil euros por este negócio de 135 anos”, frisou.
Proteção legal e reconhecimento municipal
Ainda que tenha ordem para encerrar a loja na próxima segunda-feira, o gerente da Ginjinha Sem Rival assegurou que vai manter as portas abertas até que um tribunal determine que as feche.
“Vamos manter o nosso ritmo de trabalho normal e, muito provavelmente, o senhor irá pôr uma ação de despejo, à qual nós iremos contestar em tribunal porque achamos que estamos protegidos como Loja com História até ao final do ano de 2027”, argumentou.
A Ginjinha Sem Rival, criada em 1890, é uma das 162 lojas distinguidas pela Câmara de Lisboa no âmbito do programa Lojas com História, criado com o objetivo de proteger estabelecimentos emblemáticos da cidade.
A legislação em vigor garante proteção dos contratos até ao final de 2027, sendo esse o entendimento tanto da gerência da Ginjinha Sem Rival como da Câmara de Lisboa.
Reconhecendo os limites da sua intervenção numa disputa entre privados, o autarca assegurou estar a fazer tudo o que a lei permite para evitar o fecho da Ginjinha Sem Rival e disponibilizou-se para ter uma intervenção jurídica, caso o diferendo avance para os tribunais.
Paralelamente, Diogo Moura referiu que a Câmara de Lisboa está a ultimar uma proposta de revisão do regulamento das Lojas com História, para permitir o alargamento do número deste tipo de estabelecimentos.
O vereador defendeu também uma alteração da lei por parte do Governo que permita “clarificar os direitos dos novos contratos de arrendamento e reforçar a proteção de negócios que, para além do valor histórico, demonstrem viabilidade económica e relevância cultural”.
Por sua vez, numa resposta, fonte oficial da Europe Hotels International (EHI) manifestou a sua disposição para um entendimento, reiterando que existe uma proposta financeira “muito vantajosa” que permitiria mudar a loja para outro local, mantendo a produção do licor de ginja.
O objetivo passa por manter a loja com a sua traça original e a venda de ginjinha ao público, como atualmente, mas com a realização de obras de reabilitação, tanto no interior como no exterior.
Este diferendo está a mobilizar cidadãos e associações da capital, como o Fórum Cidadania LX, que agora lamenta o possível encerramento de mais um estabelecimento comercial centenário.
“Realmente é uma tristeza que estejamos aqui agora, numa loja que foi classificada no Lojas com História, com os mesmos problemas que tínhamos há 15 anos”, refere Paulo Ferrero, do Fórum Cidadania LX.
Apesar do fim do prazo do contrato, a Ginjinha Sem Rival promete continuar de portas abertas, servindo o tradicional licor a lisboetas e turistas.
Entretanto, no dia 05 de julho, pelas 20:00, está prevista uma ação de solidariedade junto à entrada do estabelecimento, aberta a toda a comunidade.