Portugal continua a ser visto como um dos destinos mais atrativos para viver, investir ou visitar por membros da comunidade LGBTI+, apesar de ter saído do top 10 do Mapa Arco-Íris da ILGA Europe em 2025. Esta mudança, motivada, sobretudo por falhas na resposta a crimes e discursos de ódio, levanta dúvidas sobre a evolução futura do clima político e social, com impacto direto em diferentes mercados, como imobiliário ou turismo, segundo especialistas do setor.

Para muitos, a perceção de Portugal como país inclusivo e respeitador dos direitos da comunidade LGBTI+ foi, e continua a ser, uma das razões principais para escolher o território como destino de residência permanente ou temporária. Especialistas analisam as tendências e evolução de preços de compra e venda nos bairros arco-íris.

“A perceção de Portugal como um local seguro, onde a comunidade LGBTI+ é respeitada e usufrui de um conjunto de proteções e igualdades muito acima da média, foi uma das principais razões que levou muitos estrangeiros a escolherem instalar-se no nosso país”, refere João Passos, consultor e responsável pelo projeto LisboaPride. “Qualquer facto que altere negativamente essa perceção e aumente o nível de incerteza sobre o futuro dos direitos LGBTI+ em Portugal é um retrocesso e impactará seguramente a atratividade do nosso país”, acrescenta.

João Santos, consultor na João das Casas Imobiliária, considera que a atratividade internacional “pode, sim, ser afetada se o discurso de ódio ou a falta de ação política forem percecionados como crescentes”. “O turismo e a residência LGBTI+ tendem a procurar locais não só bonitos e acessíveis, mas também seguros e acolhedores”, refere. Apesar disso, confirma que, além do turismo, “há um crescimento consistente da procura por residência permanente, especialmente por parte de pessoas LGBTI+ de países onde os direitos são mais frágeis ou onde o ambiente político e social se tornou hostil”.

Os dois profissionais concordam que Portugal mantém uma imagem internacional positiva, beneficiando da sua reputação de país progressista, tolerante e seguro. Este ano, acolhe pela primeira vez o Europride - o maior evento LGBTI+ na Europa, que visa dar visibilidade à luta pela igualdade de direitos. O evento decorrerá em Lisboa até dia 22 de junho e conta com muito apoio da comunidade.

País continua a atrair compradores estrangeiros

João Santos reconhece que a inflação e o custo de vida impactam todas as decisões imobiliárias. No entanto, garante que muitos compradores internacionais — incluindo da comunidade LGBTI+ — “continuam a ver Portugal como uma boa relação custo-benefício, sobretudo em comparação com grandes centros europeus”. “A instabilidade política pode causar alguma hesitação, mas até agora não observamos um decréscimo na procura”, salienta o consultor.

Já o responsável do projeto LisboaPride destaca o número crescente de norte-americanos a procurar instalar-se definitivamente em território nacional. “Trabalhamos essencialmente dois tipos de clientes LGBTI+ internacionais: o cliente americano, que quase sempre se quer mudar permanentemente, e o cliente europeu, que na maioria das vezes ainda procura apenas passar temporadas em Portugal. Em termos percentuais, o cliente dos EUA tem ganho peso comparativamente ao cliente europeu”, revela.

João Passos adianta que a conjuntura política internacional — e mais recentemente a reeleição de Donald Trump — teve impacto direto na procura. Desde o início do ano, têm-se multiplicado os pedidos de esclarecimento de pessoas trans ou de famílias com filhos trans, preocupadas com o clima hostil nos EUA. “Com a subida do peso da extrema-direita um pouco por todo o mundo, assistimos a um certo movimento migratório de pessoas com a possibilidade de fugir a situações políticas mais extremas. Esta continuou a ser a principal razão apresentada pela maior parte dos clientes que ajudámos, já que são maioritariamente cidadãos americanos”, refere.

Contudo, as mudanças recentes no cenário político nacional, nomeadamente a ascensão da extrema-direita, já começaram a gerar alguma retração neste interesse. “Assistimos já a alguns efeitos decorrentes dos últimos resultados eleitorais em Portugal, com a subida da extrema-direita e a previsível deterioração dos direitos LGBTI+”, refere, acreditando, contudo, que a estabilidade e qualidade de vida do país continuam a pesar na balança.