A execução de obras públicas em Portugal encontra-se atualmente sob uma tempestade perfeita de obstáculos que ameaça paralisar o progresso de norte a sul do país. Uma combinação de falta de mão de obra, aumento dos custos de construção e as exigências crescentes do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) está a colocar em xeque os prazos e os objetivos de vários projetos, especialmente no setor de habitação e reabilitação urbana.

Segundo relatórios de municípios como Loulé, Albufeira, Montemor-o-Novo, Odivelas, Alcobaça, Braga e Porto, observa-se um número crescente de concursos públicos sem qualquer proposta. Os motivos incluem preços-base pouco atraentes, escassez de trabalhadores e a preferência das empresas por projetos privados. Em Montemor-o-Novo, por exemplo, um projeto de reabilitação avaliado em 6,1 milhões de euros despertou interesse em 17 empresas, mas nenhuma chegou a formalizar uma proposta. Já em Odivelas, obras importantes nas áreas de saúde e segurança não foram sequer adjudicadas.

A pressão para cumprir os requisitos do PRR está a intensificar esta situação. A Associação Nacional de Freguesias (Anafre) e vários municípios reconhecem que o volume simultâneo de empreitadas, aliado a prazos apertados e exigências burocráticas elevadas, está a afastar as empresas do setor público.

A Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas (AICCOPN) estima que faltem cerca de 80 mil trabalhadores no setor, um défice que, segundo a associação, tenderá a agravar-se com as grandes obras que estão planeadas, como o novo aeroporto de Lisboa e a ferrovia de alta velocidade. A Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro (Feviccom) também destaca que os baixos salários, a precariedade e a falta de formação são barreiras significativas para a contratação. Mesmo com um recente acordo coletivo que aumentou os salários em 13,2%, a resposta do mercado ainda se mostra insuficiente.

Os intervenientes do setor sugerem algumas ações urgentes para mitigar esta crise, tais como a revisão em alta dos preços-base, o uso de materiais e técnicas de construção menos exigentes e uma maior celeridade nos pagamentos. Caso estas medidas não sejam implementadas rapidamente, será difícil atender às metas do PRR até 2026.