Pode Vender uma Casa que Foi Doada? Descubra Tudo Sobre Vendas e Restrições!
A doação de bens imóveis é uma prática comum e bastante útil para transferir a propriedade de um imóvel durante a vida de uma pessoa. No entanto, muitos se perguntam se é possível vender uma casa que foi doada, especialmente quando o doador ainda está vivo.
A resposta para essa dúvida depende de alguns fatores legais importantes, como as condições da doação e a presença de cláusulas restritivas. Vamos explorar as diferentes situações que podem ocorrer quando uma casa é doada, abordando as permissões e restrições para a venda de um imóvel doado.
1. A Doação de Imóveis
Nos termos do artigo 940.º do Código Civil, a doação é o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberdade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente.
A doação tem como efeitos essenciais a transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito, a obrigação de entregar a coisa e a assunção da obrigação, quando for esse o objeto do contrato.
Para que a doação seja válida, é obrigatória a celebração de escritura pública num cartório notarial e o registo da transmissão na conservatória do registo predial. Só com o cumprimento destas formalidades se garante a validade e o reconhecimento da doação perante terceiros.
2. Venda de uma Casa Doada Durante a Vida do Doador
Uma vez que a doação transfere a propriedade do imóvel para o donatário, ele, em princípio, tem liberdade para dispor do bem, inclusive vendê-lo. Contudo, podem existir restrições à sua disponibilidade, como cláusulas que impeçam a venda imediata do imóvel.
- Cláusulas Restritivas na Doação: A doação pode ser acompanhada de certas condições, como a reserva de usufruto ou a reserva do direito de dispor de coisa determinada, que proíbe o donatário de vender o imóvel durante um período específico ou sob certas circunstâncias. Essa restrição deve ser expressamente estipulada no contrato de doação.
- O direito de usufruto permite ao doador manter o direito de usar e beneficiar do imóvel, embora a propriedade do imóvel passe para o donatário. O usufruto pode ser vitalício ou de duração determinada. Enquanto o usufruto estiver vigente, o donatário não poderá vender o imóvel sem o consentimento do doador, uma vez que o direito de usufruto prevalece sobre a venda.
- Alem desta restrição, o doador pode reservar para si o direito de dispor, por morte ou por ato entre vivos, de alguma ou de algumas das coisas compreendidas na doação, ou mesmo o direito a certa quantia dos bens doados. Significa isto que, o doador pode colocar cláusulas garantindo no contrato de doação que ele continua a ter algum controle, uso ou direito sobre os bens que está a doar, seja sobre parte dos bens ou sobre valores relacionados a eles, enquanto estiver vivo ou até mesmo para depois da sua morte.
3. O Doador Pode Reverter a Doação?
O Código Civil prevê que, em determinadas circunstâncias, o doador pode pedir a revogação da doação, sendo que a reversão se dá no caso de o doador sobreviver ao donatário, ou a este e a todos os seus descendentes. Além desse facto, as doações são revogáveis por ingratidão do donatário.
A doação pode ser revogada por ingratidão quando o donatário se torne incapaz, por indignidade, de suceder ao doador, ou quando se verifique alguma das ocorrências que justificam a deserdação, como ofensas graves à integridade física ou moral do doador.
Os efeitos da revogação da doação retrotraem-se à data da proposição da ação, o que significa que se considera que a doação deixou de produzir efeitos desde o momento em que foi judicialmente requerida a sua revogação.
Contudo, importa ter em conta a proteção conferida aos terceiros de boa-fé, consagrada no artigo 291.º do Código Civil. Caso o imóvel doado tenha sido, entretanto, transmitido a um terceiro, e não conste qualquer registo ou menção na certidão predial sobre a existência de condicionantes à doação (como cláusulas de reversão ou ações judiciais pendentes), esse terceiro comprador não poderá ser prejudicado pela eventual revogação da doação. O ordenamento jurídico português protege a confiança legítima dos adquirentes que agem de boa-fé e com base nas informações constantes do registo predial, assegurando a segurança e estabilidade das relações jurídicas e das transações imobiliárias.
4. Implicações Fiscais da Venda de um Imóvel Dado
No âmbito das implicações fiscais, o donatário que proceda à venda de um imóvel recebido por doação poderá ser sujeito ao pagamento de imposto sobre as mais-valias, salvo se reunir as condições legais para beneficiar de isenção. A tributação das mais-valias na venda de imóveis adquiridos por doação está prevista no artigo 10.º do Código do IRS, que define as regras aplicáveis ao apuramento do ganho sujeito a imposto.
Importa referir que o regime fiscal contempla a possibilidade de isenção de tributação sobre as mais-valias, nomeadamente quando o imóvel vendido foi afeto à habitação própria e permanente do donatário (e do seu agregado familiar), desde que o valor da venda seja reinvestido na aquisição de outra habitação própria e permanente, nos termos definidos pela lei. Além disso, poderá igualmente beneficiar de isenção caso o imóvel seja vendido após um período mínimo de três anos desde a doação, cumprindo os requisitos exigidos no Código do IRS.
5. Doações e Heranças
A lei portuguesa dispõe de um mecanismo legal utilizado para garantir a igualdade na partilha da herança quando o falecido fez doações em vida a seus descendentes (geralmente filhos) antes de falecer. Este mecanismo chama-se colação e visa assegurar que as doações feitas ao longo da vida do falecido sejam consideradas no cálculo da partilha da herança.
O objetivo da colação é evitar que um herdeiro receba uma parte desproporcional da herança em comparação aos outros, se, por exemplo, já tiver recebido uma doação significativa em vida.
Por força do disposto no artigo 2104.º do Código Civil sempre que um descendente do falecido doador pretenda entrar na sucessão do falecido deve restituir à herança, para igualação da partilha o valor correspondente àquele preço, restituição essa que se designa por colação, na medida em que, expressa ou tacitamente o doador, nem no ato da doação, nem posteriormente dispensou a colação (artigos 2108.º, n.º 1 e 2113.º, n.º 1 do Código Civil).
Conclusão:
- É possível vender uma casa recebida por doação mesmo que o doador ainda esteja vivo, desde que não existam cláusulas restritivas, como usufruto ou direito de disposição, que limitem essa possibilidade. A doação transfere a propriedade para o donatário, mas o contrato pode impor condições específicas.
- Em certos casos, a doação pode ser revogada, nomeadamente por ingratidão ou se o doador sobreviver ao donatário. No entanto, terceiros de boa-fé que adquiram o imóvel estão protegidos por lei, desde que não haja registo de restrições.
- A nível fiscal, podem aplicar-se impostos sobre as mais-valias, embora existam situações de isenção, como no caso de reinvestimento em habitação própria e permanente. Por fim, a doação pode ter impacto na partilha de herança, através do mecanismo da colação, que visa assegurar uma divisão justa entre herdeiros.